4.3.10

MORTE E POSSIBILIDADE

Quem viaja sozinho sabe que não há outra forma melhor para se conhecer pessoas do que quando se está só num outro país. E como é bom começar uma conversa com alguém que você desconhece os vícios, manias e esquisitices, e quando a língua em que se dialoga é outra que não a sua, a coisa fica melhor ainda. Digo isso para encorajar os solitários chorões que poderiam conhecer o mundo, mas não o fazem porque alegam não ter companhia. Numa dessas minhas andanças eu conheci um artista plástico. Ontem fui conhecer seu ateliê e seu trabalho. Michel Sarazin é seu nome, suas telas me lembram as dos pintores expressionistas, tem na bagagem exposições internacionais. Quem se interessar em ver suas telas pode visitar seu site que é o: http://www.michel-sarazin.fr/. Depois fomos ver uma exposição no Museu Malliol que se chama “Vanités, vie e t mort” (Vaidades, vida e morte). A exposição faz você refletir sobre a vida, a finitude, a vaidade. De Caravaggio até Damien Hirst, passando por la Tour, Picasso, Braque, Basquiat, Baselitz (que eu gosto muito), Warhol, Mappelthorp, Miguel Barcelo entre outros. É bastante boa a variedade de telas e artistas, e a exposição começa bem e acaba bem. Mas o tema é pesado, mesmo que os artistas contemporâneos tenham interpretado a morte com mais humor, menos obviedade e peso, os vários crânios e ossos expostos vão lentamente consumindo sua energia. Difícil ser sutil quando se retrata a morte. Ao sair de lá senti um imenso prazer ao receber o vento gelado no rosto. Mas ainda lá dentro, passeando entre os artistas contemporâneos refleti não sobre a morte, mas em como ficou difícil para nós homens do século 21 desenvolvermos um olhar crítico sobre o que é arte. A visão do que é arte e do artista mudou radicalmente a partir da segunda metade do século passado, e agora acho que está chegando a um outro limite que necessariamente terá que ser ultrapassado. Levando em conta minha limitação de conhecimentos para fazer uma reflexão mais profunda sobre o assunto, é gritante e quase óbvia a banalização. Não estou discutindo gosto, mas a qualidade do pensar do artista que está por trás da obra e que necessariamente está refletido na tela ou objeto que está exposto, ou no livro que está impresso. Se a gente insistir na idéia de que tudo é relativo, então a reflexão deve parar por aqui porque não chegaremos a lugar nenhum. Sim, cada um pode fazer o que quiser, escrever o que quiser, falar o que quiser, mas nem por isso tudo é bom. Há diferenças e elas devem ser ressaltadas sem provocar prejuízo ou desqualificar outros artistas. Mas como fazer isso se o olhar do homem contemporâneo é orientado por interesses que não necessariamente interessam a arte? Não tenho as respostas, mas como homem do meu tempo posso sentir - mesmo que também sofrendo a interferência do pensamento do meu tempo - a transformação e a decadência. Não tenho uma visão negativa e sem esperança sobre o tema. A morte por ser inevitável, é talvez o único meio possível de se transformar, morrer para renascer de outra forma.

Vanité por Braque



Caravaggio



E um pequenino de Michel Sarazin

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