30.5.09

+ SOBRE PRAGA

Ficou um ranço do tempo do comunismo nas pessoas que trabalham no atendimento ao público aqui em Praga. Exceto no hotel onde todos são gentis, nos restaurantes e em muitas lojas o atendimento é constragedor. Garçons e vendedores nunca sorriem, tem a cara fechada e te passam um sentimento de que estão fazendo um favor em falar com você. A maioria fala inglês ou alemão, mas tem expressões geladas e não demonstram simpatia. Deveriam tomar aulas com os vienenses, que ao contrário, são inteirinhos gentilezas.

29.5.09

PRAGA

Cheguei ontem em Praga. A temperatura caiu muito, está fazendo frio e ventando. Estive aqui em 88, um ano antes da queda do muro, ainda na era do comunismo, e a cidade era escura, os rostos tristes, vitrines decadentes, restaurantes que não funcionavam, um horror. Lembro-me de ter esperado mais de quarenta minutos o garçon me servir um café. A infelicidade estava estampada na cara dos habitantes. Vinte e um anos depois, a cidade mudou muito, está linda, com os prédios históricos restaurados, é possível sentir a energia no ar, muita gente na rua, locais funcionando onde você se sente acolhido, uma agradável surpresa. Praga talvez seja uma das cidades mais lindas da Europa. Quanto mais você a conhece mais gosta dela. Há muitas praças espaçosas, o rio que divide a cidade e as lindas pontes que conectam os dois lados dela. Hoje revi a pequena casinha de número 22 atrás do castelo onde Kafka teve seu pequeno escritorinho e escreveu alguns de seus livros. Não tem mais do que 15 metros quadrados. Foi alugada por ele, quando procurava um lugar tranquilo para escrever. Depois do trabalho ele ia para lá e só voltava para casa depois da meia noite. Além de sua irmã ninguém mais sabia que ele havia alugado a casa. Li que ele gostava de descer as escadarias do castelo de noite, depois de passar horas escrevendo, dizia que precisava daquele tempo para refrescar a cabeça. Permaneceu lá por dois anos. Fiquei imaginando ele lá dentro, sozinho, refletindo e escrevendo, a pequena janela com vista para o outro lado da cidade, me bateu uma tristeza..., mas sei que ele precisava daquele cubículo para escrever, estar só, isolar-se de todo o resto para criar.

E sabe mais o que? Me deu muita raiva porque tiraram todos os bondes das ruas de São Paulo. Fiquei imaginando o quanto mais civilizada e acolhedora São Paulo seria se os tivesse mantido, e guias rebaixadas onde a rua mais parece uma extensão da calçada e vice e versa. Por hoje é só, estou com preguiça, já devo ter engordado uns três quilos desde que iniciei minha viagem, o vinho e a cerveja são prazeres inenarráveis. Algumas fotos de Praga (de autoria do Roberto, que está curtindo a cidade tanto quanto eu que não tenho o menor saco para fotografar quando estou viajando).










26.5.09

VIENA

Já passei por Viena e agora estou em Budapest. Sinceramente, não queria sair de lá. Gosto muito de Viena, não apenas porque já vivi na Áustria e tenho muitos amigos, mas porque a cidade é um modelo de como todas outras cidades deveriam ser. Grande, sem ser desproporcional, cheia de parques que servem como ilhas refrescantes dentro do espaço urbano, museus permanentes e mostras internacionais, salas de concertos de primeira qualidade, ópera, cafés e restaurantes em abundância e um povo educado e consciente do quão bela é sua cidade e da importância de sua preservação. Não há como deixar de fazer comparações com outras cidades que conheço, mas fica ainda mais difícil não reconhecer o quanto Viena é generosa com os seus cidadãos e vice e versa. Limpa, organizada, dentro dela conseguimos ver o céu (devido ao gabarito dos prédios), espaçosa, avenidas largas, meios de transporte que funcionam, bondes, metrô, ciclovias, semáforos inteligentes, cestos de lixo a cada cinqüenta metros, um rio que não cheira mal, sinalização inteligente, enfim, uma cidade feita para o homem e não para o automóvel.

Estou com dois amigos arquitetos, Hagop Boyadjian e Roberto Leme Ferreira. Se já conhecia a cidade emocionalmente, agora eu aprendi a respeitá-la ainda mais. Com eles passei a compreender a importância do planejamento de uma cidade. Nas muitas conversas que temos durante nossas longas caminhadas, entristecemos só de lembrar da falta de respeito que os vários governos, independente da cor de seus partidos, tem para com a cidade onde moramos. Roberto é arquiteto do Condephat, e além de me contar histórias que desconhecia sobre São Paulo, me esclarece muitas dúvidas.

Volto a insistir na educação. Sem ela não haverá desenvolvimento. Sem consciência, não há registro, sem registro não há memória. Por enquanto é isso, abaixo alguns registros da cidade.











16.5.09

PARIS E AS BOAS SURPRESAS.

A vontade de viajar estava fermentando dentro da minha cabeça, então duas surpresas aconteceram para contribuir com o crescimento dela: primeiro fui convidado por dois amigos para viajar, depois quase que simultaneamente fui contratado para fazer um trabalho na Europa. O conhecido unir o útil ao agradável virou realidade e eu estou aqui em Paris. Fico uns dias aqui e depois vou para Áustria, de lá os dois amigos retornam e eu fico para trabalhar. A viagem não poderia ter começado melhor. Sempre quis conhecer Gilles Lapouge, jornalista, escritor, articulista e correspondente francês do Estadão. Hoje tive a oportunidade de conhecê-lo. Amigo de um dos meus companheiros de viagem, não tive nenhuma dúvida quando convidado para almoçar com eles. Sujeito agradabilíssimo, de voz mansa, culto, educado, simples e acessível. Almoçamos num restaurante perto de seu atelier, e adivinhe o que ele pediu para comer? Dobradinha. Isso mesmo, refogadinha com legumes e batatas. Um bom vinho, boa conversa, homem experiente, sabe ouvir e tem muitas histórias dentro de sua cabecinha para contar.



A temperatura está entre 10 e 16 graus, ideal para caminhar, caminhar e caminhar, parar nos cafés e livrarias para descansar e continuar a caminhada. Se tiver tempo e disposição, escrevo mais de onde eu estiver.






13.5.09

MISTÉRIO

Sempre que passo pelos arredores da Praça João Mendes no centro de São Paulo, encontro uma moradora de rua que certamente sofre de distúrbios mentais. Ela anda de um lado para o outro, forjando falar ao telefone aos berros, ou fica sentada na calçada, mas sempre dialoga com alguém. Fala, gesticula, grita, debate. Está sempre vestida com trapos imundos, usa um lenço mais imundo ainda na cabeça, veste muitas capas de plástico, umas sobre as outras que provocam um barulho estranho enquanto ela se locomove. Uma imagem chocante. Toda vez que cruzo com ela, me pergunto com quem será que ela imagina estar falando ao telefone. E também o que está gritando, porque a gente não consegue entender nada. Pois bem, hoje quando voltava para casa, descia a avenida Angélica e cruzei com uma outra moradora de rua que simulava falar ao telefone com alguém. Estava zangada, gritava muito. Melhor vestida que a mendiga do centro, usava roupas um pouco melhores, e nenhum saco plástico. Mas como a outra, fazia de conta que estava falando com alguém, berrava enlouquecida, e andava de um lado para o outro da rua com a mão no ouvido e gesticulando. Passei por ela e imediatamente me lembrei da moradora da Praça João Mendes. Será que as duas estão se comunicando? E o que elas estariam gritando uma para a outra? O que uma teria feito de tão mal para deixar a outra tão aborrecida?

8.5.09

MARÉS

Tem um tempo em que parece que nada dá certo, a gente tem a impressão de que invariavelmente a vida está te dizendo desculpe foi engano. A sensação é a de que a gente não se encaixa em nenhum lugar. E tem um tempo em que tudo dá certo. Você não faz nada e as coisas combinam de dar certo sozinhas. A vida abre os braços e diz vem, pode confiar, vem que eu te seguro. Não sei como esses tempos vêm e vão, se é um movimento do tipo lunar, com marés cheias e baixas, ou se os planetas todos se posicionam favoravelmente, mas a coisa é meio cíclica. Não é sempre assim, mas o tempo em que parece que nada dá certo é o tempo em que minha consciência fica mais aguçada, parece ficar mais forte e musculosa. Por outro lado, no tempo em que tudo dá certo, a consciência se distrai facilmente, entra em férias, só quer brincar e não presta muito atenção no que está realmente acontecendo. Provavelmente nada disso pode ser cientificamente provado, mas quanto mais vivo esses tempos e seus vais e vens, mais me convenço da importância deles para a construção da minha história.

ESPAÇO PÚBLICO

Um exemplo de espaço público bem utilizado é a exposição/comemoração que está sendo apresentada na Galeria Prestes Maia sobre a vida e carreira de Airton Senna. Atravesso a galeria muitas vezes a caminho da estação do metrô ou a qualquer outro destino, e sempre pensei que ela poderia ser melhor aproveitada. Uma passagem daquele porte bem no centro da cidade, sempre vazia, com escadas rolantes lentas, um ou outro gato pingado, tem sempre um ar de decadência e tristeza. Acho o lugar ideal para se fazer exposições. Sejam elas de apelo popular ou não, o espaço fica movimentado e vivo. Depois da exposição do Airton Senna, os organizadores poderiam iniciar outros tipos de mostras. Ou até mesmo um espaço para sebos e mini feiras.

6.5.09

O VERBO É LABUTAR

Mais de uma semana sem postar. Falta de tempo. Trabalho, trabalho e trabalho para organizar principalmente a vida dos outros e poder viajar alguns dias ou semanas. Os dias passam muito rápido. Sobra pouco tempo para leituras interessantes, cinema, teatro, ou passeios, mas eu sei que é por uma boa causa, então não estresso. Faço o que tenho que fazer para depois poder fazer o que quero.

O romance está pronto. Desde a conclusão pareço ter me esvaziado. Talvez por isso o mergulho no trabalho/ridiculum vitae. Ocupar o tempo cumprindo deveres e obrigações, ainda não consigo dialogar com o lúdico, ou com o que não é palpável. Não me queixo. Já entendi como a coisa funciona. Não conseguiria criar absolutamente nada agora.

No contato profissional com outras pessoas, tenho observado a variedade de medos e apegos que as pessoas desenvolvem e depois não conseguem mais se desvencilhar. Dificultam a própria vida. Ficam raivosas, e fazem a mal a si mesmas. Apego ao dinheiro, objetos, pessoas, relacionamentos mal resolvidos, vaidades, orgulho, doenças. Incrível como tudo isso vai se desenhando no rosto delas, no movimento das mãos, no jeito de falar e de olhar. O que mais me chama atenção são os limites que elas impõem a si mesmas. Ao invés de se abrir, elas se fecham. Exigem passaporte de qualquer um que tente se aproximar. Estão sempre perdendo. E não sabem a razão.