7.8.11

ABRINDO GAVETAS

No livro que reúne a correspondência entre a escritora Colette e sua amiga e atriz Marguerite Moreno, há um trecho que me toca em especial que é o seguinte: “imagine você que eu chego aqui, almoço sozinha, abro a gaveta da minha escrivaninha... e uma carta cai, apenas uma carta: era uma carta da minha mãe, uma das últimas, escrita a lápis, com palavras inacabadas e que já anunciavam sua partida... o que é curioso, a gente resiste vitoriosamente as nossas lágrimas, a gente se segura muito bem nos minutos mais duros. E depois... a gente descobre florir, uma flor ainda ontem fechada, uma carta cai de uma gaveta, e tudo cai.” A descrição do momento em que a vida cotidiana é interrompida pelas lembranças provocadas pela carta que cai da gaveta e a remete a uma outra dimensão da vida me é familiar. Conheço essa mesma sensação de desvio involuntário do trajeto dos meus pensamentos. De estar seguindo uma direção quando um som, uma palavra ou até mesmo o cheiro de um perfume basta para interromper o percurso do dia e o sentido da vida e me remeter a outro que eu acreditava já ter percorrido. (tradução espontânea do trecho da carta)

Das composições feitas por Prokofiev para violino e piano gosto muito das “cinco melodias opus 35 bis”. Elas foram inicialmente escritas para voz e piano e o violino nesse caso assume o papel da voz. Delicadas e precisas, parecem muito mais simples do que realmente são. Ao reescutá-las o refinamento da composição vem a superfície. Como quase toda a obra dele.

Diálogo entre duas garotas entre as prateleiras de uma livraria onde estive hoje a tarde.
Segurando o livro “Diário de Anne Frank”, uma garota perguntou para a outra se deveria comprá-lo ou não.
- É super triste, a tal da Anne Frank fica trancada num sótão porque tem que se esconder dos nazistas, e como não tem o que fazer passa o dia escrevendo sobre tudo o que lhe vem a cabeça, o que come, os barulhos que escuta, como vive lá dentro e etc.
- Ai deve ser bem chato, acho que não vou levar.
- Se você quer se divertir é melhor desistir de ler qualquer coisa e ir logo dançar.
- Mas você disse que adora ler e que eu deveria fazer o mesmo para me distrair.
- É, mas eu não leio para me divertir.
- Então por que você lê?
- Para não ser obrigada a escutar as bobagens que os outros falam.

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