29.5.11

PICNIC AO CAIR DA TARDE

No final da tarde de ontem Colette me ligou convidando para um picnic. Era seu aniversário e ela reunia alguns amigos na margem do Sena ao lado do Instituto do Mundo Árabe. Quando cheguei lá o sol ainda brilhava, mas o vento frio resfriava a atmosfera. Não estava nos meus melhores dias. Passei o tempo todo conversando com uma amiga dela que trabalha numa livraria no 2 ème. Falamos sobre livros e gente, pessoas que vêm a livraria a procura de livros que possam mudar os seus estados de humor e o rumo de suas vidas. Desejam mergulhar em histórias que desviem o olhar de suas realidades. A amiga de Colette me disse que nem todos são infelizes, mas todos são insatisfeitos. Buscam nos livros o que a vida não consegue proporcionar ou o que não conseguem fazer com as suas próprias vidas. Enquanto ela falava fiquei fazendo um exercício de pensamento do tipo até que ponto interferimos nos rumos de nossas próprias vidas, enfim, uma pergunta que venho me fazendo ao longo da minha própria. Eu não sei. Nos últimos dias tenho pensado bastante sobre isso. Qual é a nossa parcela de responsabilidade nisso tudo. Como conduzir a vida ao encontro da felicidade ou satisfação. Fazer as escolhas certas. Esperar menos? Sonhar menos? Ansiar menos? Planejar mais? Calcular mais? Não fazer nada disso e esperar que as coisas aconteçam? Alguns romances podem nos levar a crer que podemos encontrar o que procuramos, que basta fazer escolhas parecidas com a dos personagens que no final o resultado será positivo. Outros romances podem nos levar a crer que apesar de todo o empenho o destino não pode ser controlado, que não depende muito da gente, que aquilo tudo que vivemos enquanto líamos só aconteceu porque não fazia parte da vida real. Outros ainda não dizem nada, não concluem nada, apenas contam suas histórias e você, depois de ler a última página sai mais perdido do que entrou.

O cair da tarde quando chegava no picnic


O grupo de amigos da Colette que fez parte do picnic ontem era composto de americanos e franceses. Para mim, observador distanciado, uma mistura entre realismo puritano (se isso existe) e ceticismo romântico (idem).

Num certo momento um dos americanos começou a tocar violão e cantar canções de Bob Dilan. Ai meu Deus, tudo isso me é tão familiar e constrangedor ao mesmo tempo.

Minutos depois um grupo de brasileiros que estavam a alguns metros de nós caiu num sambão. Ai meu Deus, tudo isso me é tão familiar e constrangedor ao mesmo tempo.




Quando voltava para casa refleti sobre o que conversamos e conclui que sou o resultado de todos os livros e filmes que li e vi. Meu mundo mental é repleto de referências e imagens de obras de ficção e biografias. Carrego ideais de muitos personagens fictícios e reais, idéias e anseios políticos de outros, o humor e a melancolia de outros tantos, sou uma miscelânea de toda esses personagens que viveram dentro de mim ou que absorvi visualmente enquanto eu os descobria. Mas eu não memorizei o nome deles, não consigo localizá-los geograficamente, não sei detalhes da vida de nenhum deles. Estão todos amalgamados na massa que forma o meu cérebro.

Entre Bob Dilan e sambão, não fico com nenhum dos dois. Acho que o momento atual está mais para Wagner e Led Zeppelin.

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