Por ter morado muito tempo e mais de uma vez fora do país, muitas vezes sou indagado sobre o que diferencia nós brasileiros de outros povos e culturas, e o que nos une. Antes me surpreendia com a imagem que nós (ou a maioria dos brasileiros que conheço) temos de nós mesmos. No decorrer da conversa tentava argumentar que individualmente existem muito mais semelhanças do que diferenças, mas com o tempo desisti. Porque detesto alimentar qualquer tipo de regionalismo e ufanismo, e também porque acho esse assunto muito chato, acaba sempre em “mas você não vai negar que nossas praias são as mais bonitas” e porque percebi que na maioria das vezes as pessoas não estão verdadeiramente interessadas no que você tem para dizer, mas querem vomitar suas idéias prontas. Não importa de qual classe social ele vem, se a, b, c, d ou e (nunca na história desse país tivemos tantas subcategorias de classes sociais), o que ele quer ouvir de mim é a confirmação de suas próprias idéias fixas sobre a imagem que ele faz de si mesmo e a que faz dos outros povos. Todos adoram repetir o mesmo rosário: nós brasileiros somos antes de tudo um povo simpático, solidário e gentil, um povo que apesar da pobreza, falta de educação e dificuldades, continua sorrindo e distribuindo gentilezas gratuitamente, capaz de demonstrar solidariedade apesar da escassez de recursos tanto intelectual como material. Por outro lado para essas pessoas quase todo europeu é rico, frio, calculista, mal humorado, pouco sorridente e nada solidário. Para mim uma das características marcantes do povo brasileiro é a vontade de acreditar. O problema está na ausência de capacidade crítica diante daquilo em que quer acreditar. Não importa no que ou em quem, queremos acreditar e opinar, antes de tudo queremos fazer valer a nossa opinião, ficar do lado daqueles que acreditamos bons ou de verdades divulgadas e assimiladas sem nenhuma reflexão. Outra característica marcante é a hipocrisia, olhamos para o outro sempre com um olhar de que não fazemos parte daquele todo, os outros são sempre responsáveis pelas nossas mazelas, se não fossem os outros tudo seria diferente. Gostamos de acreditar que somos diferentes, seres humanos mais “humanos”, mais “gente”, abençoados com a ausência dos lados indesejáveis que tanto não admiramos nos outros. Sugiro uma leitura rápida em qualquer lista de comentários de leitores de qualquer blog ou site, lá onde nos escondemos por detrás de nossos apelidos e carinhas. Assusta-me a quantidade de pessoas que pensam poder afirmar suas verdades como se as mesmas estivessem acima de qualquer dúvida, afirmações muitas vezes calcadas de sentimentos de raiva e deboche e de schadenfreude (satisfação pela desgraça alheia). Assusta-me tanto o intelectual prepotente por se pensar superior àquele com menos conhecimento do que ele, como o ignorante que não reconhece nos outros mais sabedoria e que ele poderia aprender alguma coisa com quem sabe. Minha experiência pessoal é a seguinte: no coletivo todo ser humano é muito parecido, seja ele de onde for, massa é massa, é bruta, irracional e ameaçadora. Posto sob a lupa e visto individualmente, as diferenças culturais sobressaem, gentilezas e demonstrações de solidariedades e calor humano ficam mais ou menos expostas dependendo do grau de proximidade entre as pessoas, e o homem seja ele de qualquer cor pode ser a semelhança do divino. A julgar pelos comentários que tenho lido em muitos sites de jornais e de blogues de outros amigos que se atrevem a dizer o que pensam, nós brasileiros no quesito hipocrisia e prepotência conseguimos superar muitos outros povos, só não sei se por ausência de autocrítica ou por excesso de esperteza.
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