Fui ver a peça “Hilda Hilst – O espírito da coisa” no Teatro do centro da terra. Um monólogo de altíssima qualidade cênica e dramaturgia muito bem feita. Depois que sai do espetáculo fiquei imaginando a dificuldade para se montar uma peça de teatro com os textos de Hilda Hilst. É difícil. E a gente sente todo o peso dessa dificuldade durante a peça. Porque a poesia e a vida dela se misturam e acho que é essa junção que faz da peça o que ela é. A atriz Rosaly Papadopol consegue nos fazer compreender a criatura complexa que foi Hilda Hilst. Doce, amarga, lúcida beirando a loucura, e depois doce de novo. Mesmo para aqueles que não conhecem sua obra, tudo isso fica claro e acho que deve despertar o interesse em suas poesias. No início da década de oitenta do século passado (estou envelhecendo) acompanhei o Caio Fernando Abreu até a casa da Hilda, a Casa do Sol, para fazer uma entrevista. Passamos o dia com ela, almoçamos juntos, passeamos pelos arredores da casa, conheci a enorme figueira onde Caio me contou ter um dia adormecido e acordado com a voz mudada. Durante todo o tempo em que estivemos na casa dela, ela foi gentil, doce, mas eu tinha a impressão de que a qualquer momento ela viraria a mesa. Eu era muito jovem, não tinha a dimensão do tamanho e da beleza de sua obra. Depois, em 1986, numa livraria do centro da cidade, ela lançou o livro “Sobre a Tua Grande Face”, editado por Massao Ohno. Fui até lá pedir um autógrafo e me lembro do carinho com que ela me abraçou e me recebeu. Durante a peça essas lembranças foram ficando cada vez mais vivas a medida que Rosely ia unindo trechos de sua poesia construindo frases, dançando, juntando as pontas dos dedos e enlouquecendo. Fazia tempo que não ia ao teatro, e para mim, foi uma boa surpresa. Parabéns a Rosaly Papadopol e a todos que contribuíram com a montagem da peça (belo cenário e composição de cores) pela coragem de montar uma peça que, por tudo que envolve a mística em torno de Hilda Hilst, deve ter lhe custado noites de insônia.
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