19.12.08

IR E VOLTAR

Bateu um cansaço. Vou tirar uns dias de folga na praia. Ubatuba por favor não chova. Pelo menos não tanto que eu já no segundo dia comece a pensar em trocar teu nome por Ubachuva e deseje voltar. Levo notebook com meu novo romance, “Podres e Sensatos” dentro. Lilizinza Oraggio minha querida amiga fez uma revisão profissional, depois das cinco outras que eu já havia feito e não me contentava. Então agora vou lapidá-lo mais um pouquinho, deixá-lo brilhando para publicá-lo em 2009. Levo também alguns livros, “Entre nós”, entrevistas do Philip Roth com outros escritores e “Amuleto” do Roberto Bolanos que ainda me é desconhecido. Não gosto de ficar longe da minha casa, mas gosto de viajar. O que fazer para conciliar os desejos antagônicos? Não pensar. Viajar. Depois voltar e me sentir feliz por ter viajado e mais ainda por ter voltado para casa. Então vamos lá.

15.12.08

GOSTO DE CONVERSAR

Gosto de conversar com pessoas que não conheço. Das trocas de informações ainda codificadas. Do olhar dos olhos ainda curiosos. Das palavras muito bem escolhidas. Das pequenas chaves que dou e recebo. Gosto do ser humano ainda mistério.

Hoje a tarde descobri que posso não querer conhecer uma pessoa apenas porque não gosto do jeito como ela fala ao celular.

Ou.

Não obrigado, seu relógio dourado impede que eu me aproxime de você. Talvez se.

Ou.

Posso alisar o seu braço? Só isso. Só quero alisar os pêlos do seu braço. Não precisa falar nada. Já te observei o bastante para saber que fora o seu braço e os pêlos que cobrem a pele dele, nada mais em você me interessa.

Ou.

Gosto de você de costas. De frente você me decepciona.

Não. Enquanto você estava sozinho você era tão, tão... mais interessante. Depois que passou a conversar com esses dois caras palitando os dentes, prefiro observar a bolsa feita de pele de cobra daquela mulher. Será que é verdadeira ou imitação?

Ou.

Eu me sento e não faço nada. Imagino diálogos. Imagino conversar com pessoas que não conheço. Trocar informações codificadas. Olhar nos olhos delas. Curioso. Gosto do ser humano que ainda não conheço.

14.12.08

SÓ CÓLERA.


Assisti em dvd o filme “O amor em tempos de cólera”. Romance que dispensa apresentação, já que qualquer pessoa que não tenha sofrido um naufrágio e vivido isolado numa ilha como o Tom Hanks viveu no filme “Náufrago”, tem obrigação de saber um pouco sobre a história. O romance do Gabriel Garcia Márquez fala de amor. Um homem que viveu mais de meio século esperando o amor de sua vida. No livro tudo parece mais real que no filme. Sei que essa crítica parece lugar comum quando alguém resolve fazer comparações entre romances e filme baseados nesses romances. Mas nesse caso é pura verdade. O filme é bem produzido, tem cenas muito bonitas, mas frustra o leitor, ops, quero dizer o espectador. O romance/escrito tem uma força que nem o ótimo Javier Bardem no filme consegue resgatar. Lembro-me que quando li o livro as cenas me pareciam reais, transbordavam em erotismo. No filme o erotismo se transformou em alguma coisa muito próxima do exótico. Deve ter custado uma fortuna filmá-lo, mas com todo respeito ao esforço feito, ficou faltando a riqueza de detalhes e imagens que o livro consegue despertar. Sofrível.

13.12.08

POLITICAMENTE CORRETO


Não posso me esquecer de que quando falo ou critico alguma coisa da qual não gosto, faço isso do meu ponto de vista. Portanto, parto dos meus princípios para demonstrar meu desapreço ou desgosto.


Então a boca retangular da modelo fotografada e estampada nas páginas dos jornais, que a faz parecer muito mais com uma caricatura do que com uma mulher, talvez seja feia apenas para mim, enquanto que para outras pessoas seja linda e objeto de desejo.

Sou aquariano, meu ascendente é virgem, então não adianta nem me falar que sou muito crítico, porque já sei disso há muito mais tempo que qualquer um.

O que é normal? Não sei e não sou eu quem vai definir. Mas ganhei de presente uma cabeça com massa cinzenta dentro, então faço uso dela.

Se não consigo fazer uma análise crítica do que observo, então..., então..., passo a fazer parte dos que estão do outro lado, isto é, dos que não conseguem fazer uma análise crítica nem de si próprios.

Sim. Senão, não é indivíduo. É reprodutor. Que pode ser gente também, mas dentro de outro contexto.

Existem pouquíssimas verdades absolutas, todas elas são universais e servem para todos os indivíduos. Entretanto nem todo indivíduo é capaz de discernir uma verdade absoluta de uma crença pessoal. (odeio aforismos e todos os livrinhos que os propagam)

Boi, boi, boi, boi da cara preta, pega essa criança que tem medo de careta.

10.12.08

BATE E VOLTA


Tive que ir a Brasília a trabalho em viagem bate/volta. Morei lá por mais de seis meses em oitenta e seis, ainda no século passado. Depois de vinte e dois anos e virada de século, achei que não mudou muita coisa. Brasília é uma cidade agradável para se morar. Espaçosa, iluminada, arborizada, de vez em quando sopra um vento com cheirinho de mato, e uma mistura rica de gente de tudo quanto é lugar que migrou para lá. Assim que cheguei, ainda no percurso aeroporto/cidade, me deu um leve saudosismo, mas passou rapidinho. Com todos os problemas de São Paulo não gostaria de morar em qualquer outra cidade. Talvez todo brasileiro fale como eu quando fale de sua cidade, mas é assim que sinto. Fiquei hospedado na casa de um querido amigo, que na época já morava lá, e o mais gostoso foi perceber que eles continuam cultivando o hábito de se encontrar para jantar juntos, intercalando as casas, ora se cozinha na de um, ora na do outro. Assim se conversa muito, troca-se idéias, se fofoca e etc. Hábito esse que eu sinto que nós paulistanos estamos perdendo. Não acho que tem a ver somente com os problemas da cidade, como a maioria das pessoas que conheço gosta de citar o trânsito e a violência isso ou aquilo. Tem a ver com a vontade de se isolar, falta de paciência, preguiça, egoísmo e não sei mais o que. Talvez até porque estamos nos tornando menos tolerantes. Tudo parece um pouco mais pesado, mais estreito, menos generoso de uns tempos para cá. Talvez realmente tenha a ver com o estresse que a cidade nos impõe, mas acho que se continuarmos nessa toada, em pouco tempo nos transformaremos em estranhos amigos. Gente que se conhece, mas que não sabe muito da vida do outro, ou de como o outro pensa, quais são seus verdadeiros sentimentos, enfim, uma relação mais distanciada, menos intimista. Eu mesmo sou um sujeito que aprecia a solidão. Não tenho medo de estar só. Ocupo bem o meu tempo com leituras, vejo filmes e preciso ficar sozinho para escrever. Mas confesso que de vez em quando sinto falta dos amigos para dividir pensamentos e agregar outros novos. Além da vontade de voltar e rever os meus amigos, e de novamente degustar o delicioso bacalhau que comi na casa de um deles, trouxe esses pensamentos de lá comigo. Na bagagem, o que mudou, o que fazer, o que não f
azer. Vinte e quatro horas longe de casa, e um montão de novas idéias para pensar.

7.12.08

ESMOLA

Dia de pensamentos.
Não mendigar. No amor.
Na arte. Não mendigar.
Não mendigar. No trabalho.
No que mais caro lhe parecer.
Não mendigue.
Nunca mais.
Custe o que custar.
Agüente firme.
Morda uma toalha ou o próprio braço.
Reprima a tentação.
Vire o rosto para você mesmo.
Ignore-se.
Amanhã você vai acordar com alguns centímetros a mais.
Nas laterais e na altura.
Uma fortaleza.
Tarde de conclusões.
Não mendigue. Nunca mais.

6.12.08

BUENAS

Gosto muito desses dias ensolarados e frios de temperatura atípica que estão fazendo nesse início de dezembro. Me lembram as manhãs de fim de maio das ilhas gregas ou baleares, que sempre nascem acompanhadas de um vento frio, antes de esquentarem de vez a tarde. Por mim, podia ficar para sempre assim. O único problema é a saudade que dá desses lugares, do mar azul, comida e vinhos bons, e da miscelânea de gente descontraída e a fim de se divertir que a gente encontra naquelas praias. Pois é. Não sei se estou envelhecendo e o que chamo de saudades é um certo saudosismo, mas a verdade é que venho pensando com cada vez mais freqüência nesses lugares e nos seus cheiros. O homem do tempo diz que esse friozinho atípico vem acompanhando uma frente fria estacionada no oceano. Talvez seja isso. Mas acho que tem alguma coisa a mais despertando minha memória sensorial. Tenho um olfato apurado. Sinto o cheiro dos perfumes que vem de outros mares e ares. Então, que sejam bem vindos. Kalimera!

4.12.08

TEM PARA TODO MUNDO


Vi hoje um quiosque dentro da estação Sé do metrô que vende planos funerários. Você paga mensalidades a partir de R$ 41,50 e garante o lugar e como será seu funeral. Num primeiro momento é esquisitíssimo, num segundo continua esquisitíssimo, e no terceiro já me acostumei com a idéia de que é esquisitíssimo. Tenho um amigo austríaco que não acharia nada disso esquisito. Por lá programar e prever os custos e despesas de tudo que terá a ver com a sua morte é normal. Talvez seja mesmo. Mas que é esquisito ver um quiosque dentro da estação do metrô vendendo planos funerários, a isso é.


Hoje enquanto almoçava minha empregada me perguntou por que eu não trocava uns vasos que tenho sobre uma mesa redonda de lugar. Argumentei que gosto de ter os objetos que comprei pelas cidades ou países onde já visitei expostos. Completei dizendo que a casa da gente reflete um pouco do que somos. Depois de alguns minutos me surpreendi constrangido com a minha explicação que poderia ter saído da boca da Martha Stewart. Quase comecei a me chicotear, mas logo desisti, afinal, não vou conseguir deixar de ser um pequeno burguês se começar a negar o que sou. Mesmo que isso seja difícil de engolir. Então me convenci de que existem vários tipos e graduações de pequeno burguês, e mesmo sem saber em qual tipo eu me encaixo, decidi que pertenço a um que seja de fácil digestão.

O que dizer então dos livros que vão se acumulando pelas estantes e mesas de cabeceira, ou sobre os pufes? Ah sim, livros são diferentes de vasos. Tenho um carinho ainda mais especial por eles. Gosto deles enfileirados sobre as prateleiras. Não coleciono nada. Não tenho aquários cheios de rolhas ou caixinhas de fósforos, ou soldadinhos de chumbo. Mas sou feito de carne e osso, livros são meus objetos de desejo e eu tenho muito ciúmes deles. Não os empresto para ninguém. Prefiro comprar e dar de presente a emprestar um livro que eu tenha lido e gostado.

Por outro lado sou um burguês que não dá o menor valor a carros, jóias, relógios, roupas de grife, bares badalados, não uso a palavra fake para definir o que é falso, nem uso óculos inóóórmes na cara.

3.12.08

O PODER DOS CAFONAS


Não sei quantos quilômetros eu caminhei hoje, mas foram muitos. Subi toda a avenida Angélica até alcançar a avenida Consolação e então atravessei toda a extensão da avenida Paulista até alcançar o SESC. Quando acabei o que tinha que fazer, retornei novamente a pé para meu apartamento refazendo todo o trajeto que, como disse meu querido amigo Alan, fica no “baixo Higienópolis”, porque já muito próximo da estação Marechal do metrô, e, portanto não tão chique como todo resto do bairro. Na volta já escurecia e eu pude apreciar a cafonice das decorações natalinas que enfeitam as fachadas dos prédios do bairro. Meu Deus do céu, eu gostaria de saber como/quando/quem disse que todos esses milhares de luzinhas piscando em torno dos troncos, grades, portarias, janelas, grades e batentes, são bonitas e chiques? E os pequenos veadinhos feitos de palha e arame ou papais Noel subindo escadinhas? Coroando a cafonice a fachada do shopping Higienópolis com seus ursos de pelúcia gigantes, pescando em laguinhos, virando as cabecinhas, não sei como ninguém ainda pensou em também iluminá-los ou fazê-los cantar o jingle bell. No natal a classe média brasileira tem a oportunidade de mostrar toda a sua breguice e o faz com muito talento e abundância. Fora o cenário sinto um prazer imenso em caminhar pela cidade e voltar para casa a pé. Por volta das sete e meia da noite, quando eu atravessava a consolação, a avenida Paulista, o túnel que levam os carros dela para a avenida doutor Arnaldo e a própria avenida consolação estavam intransitáveis. Tudo parado. Fileiras enormes de automóveis e ônibus parados. Enquanto isso minhas duas pernas me transportavam com rapidez pelas ruas. Não sei aonde tudo isso vai dar, quero dizer, a cafonice e o trânsito da cidade. Torço para que as pessoas deixem os carros em casa e utilizem mais os meios de transporte público e também para que revejam seus gostos. Mesmo que aparentemente distantes acho que as duas coisas andam juntas. Menos gente, menos. Caminhem mais e ao invés de comprarem tantas luzinhas comprem espelhos.

2.12.08

DO CÉU

Todo mundo já ouviu falar na providência divina, mas nem todo mundo já foi apresentado a ela. Pelo visto ela não tem uma única aparência, e se manifesta de muitas formas. Não dá as caras quando a gente pede, mas aparece exatamente no último minuto do segundo tempo e resolve nosso problema. Uma benção. Fazendo parecer que é um milagre. Mas não é. É intervenção do tipo mais raro. Eficiência potencializada. No momento certo, na hora certa, quando a gente começa a achar que tudo já está perdido, é aí que ela vem e roda a baiana. Manifesta-se na forma humana, numa frase que repentinamente aparece pronta dentro da nossa cabeça, ou em outras saídas. Sim, é isso. São saídas que se abrem nos paredões dos becos sem saídas. E a luz vem, e tudo fica claro novamente. Questão de fé. Ajuda muito. Persistir.