1.4.10

COLETIVO ESQUECIDO

Participar de uma reunião de condomínio apenas alguns dias depois de aterrissar no país é um exercício de paciência e poderia servir como teste de avaliação para se conhecer até que ponto é possível se manter equilibrado mentalmente confinado numa sala com seus vizinhos. Quem imagina que é preciso uma câmara instalada como nesses realities shows para observar o comportamento dos mais variados tipos de pessoas, ou o confinamento de longa duração, se engana. É muito mais rápido, quase instantâneo, basta participar de uma dessas reuniões que duram de duas a três horas. Não conheço outra situação melhor para observar falta de educação e grosserias. Realmente é um retrato grotesco, porém não menos realista, da classe média brasileira. Deve ser assim em outros condomínios também, talvez com menos ânimos exaltados, mas de qualquer forma uma exposição de egos deformados e gente que não tem espelho em casa. O que assisti ontem na reunião que participei seria o suficiente para alterar o nome de condomínio (onde se imagina que pessoas compartilhem de forma igualitária seus direitos e deveres) para favela vertical (não preciso explicar, e sei que favela não necessariamente é sinônimo de moradia de marginais). Gente “de bem”, professores universitários, advogados, médicos, arquiteta, desembargador, donas de casa e seus maridos possuidores de carros que de tão grandes não cabem nas vagas de garagem, enfim representantes clássicos da sociedade defendendo seus direitos de condôminos pensando apenas em seus próprios umbigos e desfilando soberba e pretensão. Para toda essa gente bem calçada no alto de seus saltos altos o que vale é a máxima, “eu sou mais eu, o resto que se dane”, ou a frase que infelizmente não enterraram junto com seus brinquedos em alguma praia de suas infâncias mal educadas, “eu quero, porque quero, e não estou nem aí com quem não quer o mesmo que eu”. Não tenho a intenção de ditar regras para ninguém, nem acho que resolva, mesmo porque quanto mais o tempo passa, mais aumenta a minha descrença num ser humano menos egoísta e mais altruísta. Sempre volto arrasado para o meu apartamento depois de uma reunião de condomínio. É uma das situações mais reveladoras que conheço, e também uma das mais constrangedoras.

Caminhando pela cidade, quase me arriscaria a dizer que nossas ruas estão mais limpas que as de Paris. Por vezes a cidade luz é tão ou mais suja do que a nossa. Enquanto estive por ali caminhei muito mais do que costumo caminhar por aqui, pela própria facilidade que a geografia da cidade oferece. E inúmeras vezes a sujeira me chamou atenção. Aqui como lá, as pessoas levam seus cães para fazerem as necessidades nas ruas, jogam papéis e lixo nas calçadas enquanto caminham, e não estão nem aí. Não vou nem começar a comentar sobre morador de rua porque não conseguiria avaliar onde é pior. Educação tornou-se um problema maior do que toda essa discussão sobre aquecimento global e blá blá blá. Não adianta querer ditar regras do que é certo e errado para uma sociedade que relativiza argumentos racionais e lógicos de acordo com seus interesses individuais. O lixo das ruas é só um exemplo da falta de sensibilidade para pensar coletivamente. Talvez um programa de educação confeccionado com base nos princípios básicos que facilitam a convivência entre os seres humanos, seria mais eficiente do que milhões de dinheiro investido em campanhas que chamam nossa atenção para a proximidade do fim do mundo. O fim do mundo virá com a falta de educação.

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