6.7.09

CENÁRIOS

Caminhar pelo centro de São Paulo é como caminhar dentro de uma enorme lata de lixo. Nas ruas, além da sujeira, camelôs, barraca de milho ou até carros que espremem suco de laranja na hora, muita gente miserável e doente mendigando ou dormindo nas calçadas. Bem no início da Rua Sete de Abril hoje a tarde havia pelo menos quinze pessoas dormindo na calçada em frente a uma loja que tinha as portas fechadas. Depois ao redor da boca do buraco do metrô, mais umas dez dormindo sobre as grades. Triste, triste, triste. E quando já pensava em me jogar do Viaduto do Chá, eis que vejo uma quaresmeira toda florida, sem nenhuma folha, apenas os galhos carregados de flores rosa choque sob o viaduto, do lado direito de quem olha sentido zona norte. Um colírio para olhos cansados de ver miséria e sujeira.

Vamos para a arte que é mais fácil de digerir, fica restrita ao campo do pensamento e da reflexão e a gente faz de conta acreditar que porque é ficção, não tem nada a ver com a realidade. Fui assistir o filme “Horas de Verão” no sábado a tarde. Sala cheia, até a última poltrona todos os lugares ocupados. O filme é bom, me deixou bastante aflito, diálogos rápidos, interrompidos, tema delicado, herança, passado, o que fazer com ele no presente nosso de cada dia. Silêncio total na sala. Todos os presentes prestando muita atenção. O filme não conclui nada, não tem a intenção de ser didático, mas de expor algo que afeta toda humanidade: transição da herança cultural, o que podemos ou devemos fazer. Preservar? Enclausurar em museus? Apagar de nossas vidas fugindo para o oposto de tudo o que foi construído por nossos antepassados? Falo por mim, apenas por mim, e não gosto do rumo que estamos nos levando. Não haverá graça. A formalidade é necessária, sem tradição e continuidade não há registros. E é isso que já se vê. No final do filme, o casal de jovens, formado pela neta da velha senhora morta que um dia foi detentora de todo aquele patrimônio, pula um muro porque não quer ser visto, passam para o outro lado do terreno, onde não há nada além do mato alto. No nosso caso é lixo sobre lixo, gente miserável e louca pelas ruas. Prestem atenção no número cada vez maior de sem teto e morador de rua espalhados pelas ruas da cidade.

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