20.4.11

PATCHWORK

Hoje um provérbio que uma amiga austríaca costumava me dizer me veio a cabeça. Ele diz mais ou menos o seguinte: “aproveite o que o destino está te oferecendo, não o ambicione”. Tem um q de frase saída de livro de auto-ajuda, mas estou tentando dar o valor devido a ela, reinterpretá-la. Aceitar as coisas como são nunca foi o meu forte, continuo não resignando diante de situações que apresentam dificuldades, mas estou menos tenaz. O problema é o cansaço e a descrença que passaram a me frequentar nos últimos tempos. Alguma coisa mudou. Ainda não sei bem o que. Antes achava que as coisas de alguma forma se encaixavam e aquela história de que no fim tudo dá certo de alguma forma me fazia um ser mais esperançoso. Agora hesito, duvido e o medo tem me visitado.

Encontrei um livro que traz toda a correspondência entre Baudelaire e sua mãe. As cartas foram trocadas durante os últimos dois anos de sua vida, quando ele foi para Bélgica tentar vender suas obras para os editores de lá e voltar a Paris com dinheiro e pagar suas dívidas. Fracassou, não conseguiu fazer o que ele chamava de “grande affaire” em suas cartas para a mãe que o financiava assiduamente. Morreu amargurado, duro, entristecido, doente e achando que ninguém o reconhecia como poeta. Numa carta a Narcisse Ancelle ele conta que depois de ter combinado verbalmente o valor de 500 francos para fazer cinco conferencias, recebeu apenas 100 francos, e os organizadores argumentaram que não tinham mais dinheiro em caixa, pagaram 50 francos pelas duas primerias, as outras três eles consideraram um ato de generosidade de sua parte e não pagaram. Na mesma carta ele escreve não ousar contar a sua mãe o que havia acontecido, sentia vergonha por depender economicamente dela e ter que pedir mais dinheiro. Para mim deveriam canonizar Baudelaire, por tudo, obra e vida, e sua mãe Mme Baudelaire também deveria ser canonizada.

O lançamento do meu romance “Dissonantes” vai sofrer um atraso. Ficou para agosto ou setembro. Enquanto isso, escrevo outras histórias. C’est comme ça.

Encontrei uma gravação de 1952 das canções de Strauss com a soprano suíssa Lisa Della Casa, acompanhada pela Filarmônica de Viena e dirigida por Karl Böhm. Ouvi quetinho ao mesmo tempo em que devorei um quilo de aspargos com um creme maionese limão que um amigo fez para mim e bebi quase uma garrafa inteira de vinho branco gelado. Noite de lua cheia. Quente. Hoje fez 26 graus em Paris. Grandes prazeres. Os sentidos estão aí.

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