26.2.09

AMOR E LIXO

Ontem peguei o finalzinho do filme “A branca de neve e os três patetas” na tv paga. Não sei como ainda não tinha assistido. Quando criança eu adorava os três. Gostava de ver o Moe, o mais bravo dos três, praticando suas maldades. O Larry (cabelos iguais aos do Bozo) ainda provocava pequenas crueldades, mas o Curly sempre foi vítima. Só apanhava, não importava quem havia feito a bobagem, a culpa sempre recaía sobre ele. Liguei a tv bem na hora em que a rainha bruxa estava voando e cantarolando o prazer de ter matado a branca de neve. Pura diversão. Tempos em que ainda não havia a prática do politicamente correto no humor nem em nenhum outro lugar.

Do livro “Amor e lixo” de Ivan Klima: “existe pouca coisa que se aproxime tanto da morte quanto o amor realizado”. Então eu fecho o livro. Depois releio o parágrafo em que a frase se encontra. Fecho o livro de novo. Realmente quase tudo que é óbvio tem que ser dito para que possamos compreender o quanto é óbvio. E só se torna óbvio depois de escancarado. Eu não o conhecia antes de ler a entrevista feita pelo Philip Roth no livro “Entre nós”. Há alguns escritores que não só contam muito bem suas histórias, mas que tem a capacidade de revelar o que ainda está por vir. Klima é um desses escritores. Sobrevivente do holocausto, depois do regime comunista na antiga Tchecoslováquia, não perdeu a sensibilidade e nem a vontade de descrever a vida. Poderia ter “secado” depois de tudo que teve que passar. Sabe se utilizar da palavra para transformar o amargo em doce. Da mesma geração de Milan Kundera, sem querer comparar, mas já comparando, ele é muuuito melhor. Profundo, atual, contemporâneo.


Estão construindo um prédio ao lado do meu. Vou ter que explodi-lo. Não vai ter jeito. A crise econômica poderia ter chegado um pouco antes. A construtora certamente não teria conseguido o financiamento para levantá-lo, e não teríamos mais um desses prédios com fachada neoclássica brotando do asfalto. Terei como vizinhos famílias neoclássicas, que poderão me observar de seus terraços neoclássicos. Não sei de onde eles brotam, mas aumentam a cada dia. Por que bem aqui do meu lado? Não poderiam ter ido para a Vila Nova Conceição? O paraíso neo clássico? Um amigo me disse que isso só pode ser carma. Tenho que aprender a viver com as diferenças, cultivar o respeito pelo diverso. Vou começar comprando umas colunas de gesso neoclássicas para decorar minha varanda.

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