Refletindo a possibilidade da vida ser o resultado entre determinação e acidente fui me vendo cada vez mais encurralado. Quanto de determinação seria preciso para que os acidentes se produzissem ao longo do caminho percorrido em função dessa mesma determinação? Os apressados diriam que acidentes não se produzem, por isso mesmo são acidentes, ocorrências inesperadas. Mas e se os acidentes forem acasos independentes? E ainda, e se eles não tiverem nenhuma relação com a determinação, e se auto produzem espontaneamente, desconhecendo o lugar onde são inesperados. Talvez alguns tenham autonomia, vida própria, e estariam determinados a interferir como um raio sobre nossas vidas. Como os personagens de um livro que começa a ser escrito, movidos pelo determinismo do autor, mas sujeitos a mudanças de destino por causa da “autonomia” que adquirem no decorrer da escritura da trama. Uma boa quantidade de acidentes pode tornar a vida bem mais interessante, é fato, mesmo que as vezes inconvenientes. O determinismo puro nada mais seria do que a precocidade da morte, a vida cumprindo uma função biológica, começo meio e fim e nenhuma experiência entre os períodos. Um sujeito poderia insistir, fingir seguir o seu caminho ignorando os acidentes de percurso. Poderia, e sua vida ficaria reduzida a execução do percurso. Mas, consciente da existência desses acasos, isto é, tendo consciência da margem de erro, teria ele condições de evitá-los ou de ao menos desviar da inevitabilidade dos acidentes? Não creio que a maioria dos acidentes é vista como tal, mas como dificuldades advindas da determinação. A reflexão sobre o que acontece “por acaso” é menos profunda, recebe o nome de contratempo. Contratempo.
30.10.10
26.10.10
VIDA DUPLA
Um dos livros que estou lendo da imensa lista indicada pelos professores do mestrado me trouxe algumas informações que gostaria de compartilhar com vocês. O nome do livro é “A condição literária – A vida dupla dos escritores”. O autor, Bernard Lahire, fez um grande estudo sobre o longo caminho que os autores percorrem até se aceitarem como escritores. Vou evitar os dados porcentuais da pesquisa feita pelo autor, para não encher vocês com números, e vou apenas citar alguns dados dela já que o estudo tem mais de 600 páginas. Então vamos ao que interessa.
A grande maioria dos autores por exemplo, só passa a se auto denominar “escritor” depois de muitos livros publicados e alguns prêmios recebidos, ou ainda somente depois de ter sido publicado por uma grande editora. Antes disso, mesmo que ele tenha escrito muitos livros, raramente eles se dizem escritores, na maioria das vezes quando alguém lhes pergunta se são escritores eles afirmam apenas “que escrevem”.
Se por um lado a maioria dos escritores considera o que fazem um produto de “criação”, por outro lado só uma pequena parcela deles considera que “escrever” é uma verdadeira profissão. A explicação é a péssima remuneração proveniente do “escrever”. Normalmente o segundo métier é sua fonte de renda e por isso considerado sua verdadeira profissão.
Com raras exceções todos os escritores têm o que ele chama de “segundo metier”. Essa segunda profissão muitas vezes nada tem a ver com o que ele realmente gosta de fazer, que é escrever, mas como ele não consegue viver do que escreve, tem que trabalhar para sobreviver e se transforma num sujeito muuuuuuito infeliz. As vezes se deprime a tal ponto que despiroca e abandona tudo e todos porque acha que se não escrever ele vai morrer.
Outra peculiaridade é a vida privada desses autores. Família, mulheres, maridos, casos e afins também interferem no processo de aceitação. Mas muitas vezes nem quando um desses anexos o considera escritor, ele consegue se aceitar como tal. Na verdade ele precisa de uma série de combinações para poder se olhar no espelho e dizer: sou escritor. Por exemplo, ser reconhecido por outros escritores, publicar muitos livros, receber prêmios, ser reconhecido pela mídia especializada e etc...
Normalmente o auto grau de investimento psíquico exigido todo o tempo no processo de criação, que o faz pensar sobre a escrita mesmo quando ele não está escrevendo, é determinante para a construção e aceitação de si mesmo como escritor. Outro elemento determinante na construção de sua própria imagem e aceitação é a disposição material e espacial reservada para o ato de escrever. Se faltar um desses elementos, normalmente ele também não se denomina “escritor”.
Mais de três terços deles tem constantemente a sensação de “serem interrompidos” nos seus processos de criação. Outro mesmo tanto reserva parte de seu tempo para a escrita, procura espaços silenciosos e se isola. Nesses momentos não querem ver ninguém, e toda e qualquer pessoa pode ser um fator de distração e por isso mesmo de irritação.
Para um escritor autonomia tem um critério de avaliação própria. Ela é primeiramente e antes de tudo definida a partir do controle do tempo que ele tem para se dedicar a literatura.
A grande maioria dos autores por exemplo, só passa a se auto denominar “escritor” depois de muitos livros publicados e alguns prêmios recebidos, ou ainda somente depois de ter sido publicado por uma grande editora. Antes disso, mesmo que ele tenha escrito muitos livros, raramente eles se dizem escritores, na maioria das vezes quando alguém lhes pergunta se são escritores eles afirmam apenas “que escrevem”.
Se por um lado a maioria dos escritores considera o que fazem um produto de “criação”, por outro lado só uma pequena parcela deles considera que “escrever” é uma verdadeira profissão. A explicação é a péssima remuneração proveniente do “escrever”. Normalmente o segundo métier é sua fonte de renda e por isso considerado sua verdadeira profissão.
Com raras exceções todos os escritores têm o que ele chama de “segundo metier”. Essa segunda profissão muitas vezes nada tem a ver com o que ele realmente gosta de fazer, que é escrever, mas como ele não consegue viver do que escreve, tem que trabalhar para sobreviver e se transforma num sujeito muuuuuuito infeliz. As vezes se deprime a tal ponto que despiroca e abandona tudo e todos porque acha que se não escrever ele vai morrer.
Outra peculiaridade é a vida privada desses autores. Família, mulheres, maridos, casos e afins também interferem no processo de aceitação. Mas muitas vezes nem quando um desses anexos o considera escritor, ele consegue se aceitar como tal. Na verdade ele precisa de uma série de combinações para poder se olhar no espelho e dizer: sou escritor. Por exemplo, ser reconhecido por outros escritores, publicar muitos livros, receber prêmios, ser reconhecido pela mídia especializada e etc...
Normalmente o auto grau de investimento psíquico exigido todo o tempo no processo de criação, que o faz pensar sobre a escrita mesmo quando ele não está escrevendo, é determinante para a construção e aceitação de si mesmo como escritor. Outro elemento determinante na construção de sua própria imagem e aceitação é a disposição material e espacial reservada para o ato de escrever. Se faltar um desses elementos, normalmente ele também não se denomina “escritor”.
Mais de três terços deles tem constantemente a sensação de “serem interrompidos” nos seus processos de criação. Outro mesmo tanto reserva parte de seu tempo para a escrita, procura espaços silenciosos e se isola. Nesses momentos não querem ver ninguém, e toda e qualquer pessoa pode ser um fator de distração e por isso mesmo de irritação.
Para um escritor autonomia tem um critério de avaliação própria. Ela é primeiramente e antes de tudo definida a partir do controle do tempo que ele tem para se dedicar a literatura.
24.10.10
BIUTIFUL E BIUTIFUL
“Biutiful”, o novo filme de Iñarritu é uma porrada no estomago. O espectador passa quase duas horas e meia de filme tentando respirar de alguma maneira. Sofre com Javier Bardem, sofre com os imigrantes chineses, sofre com os imigrantes africanos, sofre com os filhos dele, sofre sem parar com a sucessão de imagens duras e realistas do cineasta mexicano autor de “Amores perros”, “21 gramas” e do holywoodiano “Babel”. A força das imagens é um dos trunfos do cinema, e Inãrratu e seu câmera sabem disso. Nem tudo é perfeito, mas a maior parte do filme convence. E o (sub) mundo certamente pode ser ainda pior. Tem doses de discurso politicamente correto, mas escancara a podridão sem filtrar seu fedor. Se conseguir assistir o filme com os dois lados do cérebro ligados, vai perceber que tecnicamente o filme é perfeito. Um exemplo é a cena em que a polícia cerca os africanos numa praça de Barcelona. Mas não vai ser fácil se distanciar das emoções. Javier Bardem e igualmente a atriz argentina Maricel Alvarez vão te deixar muito próximo do desespero e da angústia. Ao contrário do que alguns críticos daqui fizeram questão de ressaltar como o único ponto negativo do filme, a espiritualidade e a possibilidade de dialogar com os mortos, atributos de Uxbal, o personagem interpretado por Bardem, na minha opinião dão ao filme a sustentação necessária para a credibilidade da história. Porque a vida de Uxbal (e a nossa) sem a fé seria insuportável. Não só ele, mas tudo em sua volta está apodrecendo. A moeda de troca nesse caso ultrapassa o valor do dinheiro. Pequenos atos oriundos de uma moral própria do submundo, dão aos homens que dele e nele vivem um sentimento de dignidade e redenção que as condições precárias de sub-existência lhes tiraram. E a fé entra nesse contexto como uma sobrevivente de todas as esperanças que já foram enterradas vivas. A trilha sonora do filme também é um dos pontos positivos e ajuda a confundir o lado esquerdo e o direito do nosso cérebro. Vá sem medo de sofrer. Posso te garantir que tua vida é no mínimo um pedacinho da ilha de caras perto da vida de Uxbal.
Mas se quiser uma sessão da tarde café com leite, mas nem por isso menos boa, vá assistir o novo filme de Woody Allen, que aqui recebeu um nome beeem compriiido: “Você vai encontrar um belo e triste desconhecido” A boa qualidade "quase" constante de Allen, atores de primeira, Anthony Hopkins, Naomi Watts e o canastrão Antonio Banderas que bem dirigido consegue nos enganar, é uma garantia de que você não vai jogar nem seu tempo nem o seu dinheiro fora. Gosto do tema e de como Allen o aborda. Envelhecer, medo da morte, fé (olha ela novamente aí) e o acaso (ou será o destino?) tudo isso na mão do diretor americano é um prato cheio. Compre seu saco de pipocas e vá. Posso te garantir que tua vida é no mínimo parecida com alguns dos personagens do Woody Allen. E se não for, então você passou duas horas sem pensar nos candidatos e em suas propostas inteligentes que vão transformar o Brasil num país ainda mais perfeito.
Mas se quiser uma sessão da tarde café com leite, mas nem por isso menos boa, vá assistir o novo filme de Woody Allen, que aqui recebeu um nome beeem compriiido: “Você vai encontrar um belo e triste desconhecido” A boa qualidade "quase" constante de Allen, atores de primeira, Anthony Hopkins, Naomi Watts e o canastrão Antonio Banderas que bem dirigido consegue nos enganar, é uma garantia de que você não vai jogar nem seu tempo nem o seu dinheiro fora. Gosto do tema e de como Allen o aborda. Envelhecer, medo da morte, fé (olha ela novamente aí) e o acaso (ou será o destino?) tudo isso na mão do diretor americano é um prato cheio. Compre seu saco de pipocas e vá. Posso te garantir que tua vida é no mínimo parecida com alguns dos personagens do Woody Allen. E se não for, então você passou duas horas sem pensar nos candidatos e em suas propostas inteligentes que vão transformar o Brasil num país ainda mais perfeito.
23.10.10
A VOZ DA CONSCIÊNCIA
Você já falou sozinho? Eu já. E ultimamente tenho sentido prazer em dialogar comigo mesmo. Ando pelas ruas soltando a voz. Até pouco tempo refletia sobre o que eu não conseguia entender silenciosamente, num diálogo interior, uma espécie de monólogo cheio de pudor. Agora boto para fora, falo com os meus fantasmas e mando eles pararem de me encher o saco. Normalmente os pensamentos vem cheios de vícios de raciocínio, com a cara maquiada de pseudo verdades ou afirmativas, e porque a gente se acostumou a aceitá-los como donos da razão, não dialogamos com eles. Resolvi me rebelar, discuto, e se eles continuarem a insistir em me desestruturar eu até mando calar a boca. A sensação de alívio depois dessa dose de auto autoritarismo é quase como a que temos depois de tomar um copo imenso de água com sal de frutas: alívio imediato. Experimente, você não vai se arrepender.
Ontem passei a tarde estudando uma conferência feita em 1969 por Michel Foucault no Collège de France quando ainda era professor de filosofia no Centro experimental de Vincennes. O tema: “O que é o autor? ” Algumas xícaras de café e horas depois meus neurônios e minhas costas pediram descanso. O homem tinha um raciocínio lógico admirável, e para um simples escritor estudante como eu, que nunca se preocupou em pensar sobre o próprio ofício mas apenas em escrever, o tema é fascinante. Passava das dez quando tomei um banho e saí para beber um copo de vinho e ver se encontrava alguém para conversar. Encontrei, mas não quem eu queria, por isso preferi não conversar, mas beber. Ainda tenho ideais por isso as vezes (e bota vezes nisso) preciso beber para borrá-los um pouco. Nem sempre o que a realidade me oferece combina bem com meus ideais, por causa disso, prefiro ficar só que mal acompanhado. Sou teimoso, talvez mais teimoso que idealista. Nem estou falando de amor. Só alguém para passar algumas horas e alimentar os ideais com doses grandes de esperança. Alguns copos de vinho depois as coisas mudam. Posso escolher se quero terminar a noite mais realista e menos esperançoso, ou mais esperançoso e menos realista. E aí que a coisa pega. Aquela voz interior quer começar a querer sair da toca e a gente tem que se impor, mandá-la calar a boca e ficar no lugar dela. Incorruptível. Voltei para casa disposto a continuar esperançoso, mesmo que cada vez mais realista.
Ontem passei a tarde estudando uma conferência feita em 1969 por Michel Foucault no Collège de France quando ainda era professor de filosofia no Centro experimental de Vincennes. O tema: “O que é o autor? ” Algumas xícaras de café e horas depois meus neurônios e minhas costas pediram descanso. O homem tinha um raciocínio lógico admirável, e para um simples escritor estudante como eu, que nunca se preocupou em pensar sobre o próprio ofício mas apenas em escrever, o tema é fascinante. Passava das dez quando tomei um banho e saí para beber um copo de vinho e ver se encontrava alguém para conversar. Encontrei, mas não quem eu queria, por isso preferi não conversar, mas beber. Ainda tenho ideais por isso as vezes (e bota vezes nisso) preciso beber para borrá-los um pouco. Nem sempre o que a realidade me oferece combina bem com meus ideais, por causa disso, prefiro ficar só que mal acompanhado. Sou teimoso, talvez mais teimoso que idealista. Nem estou falando de amor. Só alguém para passar algumas horas e alimentar os ideais com doses grandes de esperança. Alguns copos de vinho depois as coisas mudam. Posso escolher se quero terminar a noite mais realista e menos esperançoso, ou mais esperançoso e menos realista. E aí que a coisa pega. Aquela voz interior quer começar a querer sair da toca e a gente tem que se impor, mandá-la calar a boca e ficar no lugar dela. Incorruptível. Voltei para casa disposto a continuar esperançoso, mesmo que cada vez mais realista.
21.10.10
J. M. BASQUIAT
Ontem na hora do almoço entre uma aula e outra fui com amigos ver a exposição do Jean Michel Basquiat no MAM daqui. Fila na bilheteria, fila para comprar os livros dele e muita gente nas salas. Mais de uma centena de quadros foram expostos e muito bem distribuídos e agrupados, seguindo datas e galeristas que o acompanharam. Não gosto de tudo o que vi, mas gosto de grande parte das suas obras. Basquiat ao contrário do que muita gente pensa não saiu do nada, era filho de uma família de classe média do Bronx, mãe e pai instruídos, teve acesso a cultura e desde criança visitou com sua mãe museus e galerias de arte. Nas telas muita violência, morte, injustiça social e racismo, retrato de América de sua época (e desde sempre). A leitura que faço de suas obras não é de caos, ou de alguém que pintou as telas como se estivesse em transe, mas as cores que dão forma a muitos signos e símbolos aparentemente sem sentido, são produto de reflexão e de uma consciência estética muito bem preparada. Saí da exposição exausto. Cada um daqueles quadros exige do visitante paciência e concentração, são muitas as informações neles contidas. Entre as obras algumas feitas com Andy Warhol, e uma especialmente boa é a leitura feita de Warhol por Basquiat, uma banana semi descascada com um pedaço da fruta ainda dentro da casca onde não se vê nenhum rosto, mas o pedaço da fruta sobressalente é a cabeça do Warhol. Alguns desenhos agrupados têm uma força estética muito forte, mesmo que quando de perto para nós não fazem sentido, o conjunto e o agrupamento é impressionante. Não é possível visitar a exposição e dizer que ela é linda, não é o belo o que se vê nas suas telas e nem acredito que ele estivesse preocupado com isso, mas a produção de um artista urbano inovador, sem comparativos, um misto de pintura figurativa expressionista que deu forma a sua energia criando obras sem nenhuma preocupação com a estética pré existente, por isso mesmo genial. A exposição fica até 30 de janeiro de 2011, vale a pena ver de perto.
18.10.10
NARCISOS
Quando eu ainda era adolescente e comecei a ler os meus primeiros livros, acreditava que os personagens ou pelo menos o personagem principal da história era o espelho do autor que havia escolhido para ler. Na verdade acho que o motivo principal da escolha de um livro era a vida privada do autor. Queria saber tudo, se ele era casado ou solteiro, se era de esquerda ou de direita, o que fazia além de escrever, qual o seu país de origem, como ele pensava, e etc... e quando começava a ler já tinha uma idéia preconcebida do sujeito. Muitas vezes gostava muito mais do autor do que dos livros que ele escrevia. Com Sartre foi assim. Gostava de sua imagem de intelectual engajado e ainda tinha a história dele com a Simone de Beauvoir, um casamento que para mim representava um modelo de união e liberdade. Fui adolescente na década de 70, o Brasil vivia uma ditadura militar, eu tinha conhecimento sobre a situação política do país através do meu pai, um leitor assíduo de jornais e um sujeito que gostava de comentar e ouvir a opinião dos filhos. Escolhia meus autores quase na totalidade por que de alguma forma eu imaginava que eles eram ou haviam sido transgressores ou porque tinham uma posição política a qual eu simpatizava. Gide, Hemingway, Camus, Virgínia Woolf, Norman Mayler, Gore Vidal, Jean Genet, Paulo Francis (li seus livros de narrativa complicadíssima), Jorge Amado, comecei com eles. Patrícia Highsmith talvez foi uma das primeiras autoras que eu passei a ficar interessado a partir de suas histórias. Li todos os livros dela ainda quando morava na Áustria, e só depois fui me interessar por sua vida privada. Com Thomas Mann, Hesse e Kafka foi a mesma coisa, mas eu já era mais velho e já havia começado a vivenciar algumas desilusões e a me desiludir com a figura do intelectual engajado. A partir daí passei a me interessar mais pelas histórias, a prestar mais atenção na trama, na construção dos personagens, no perfil psicológico deles e etc... Lógico que a imagem ideal do escritor para mim ficou sendo a de um sujeito com posições políticas humanistas, não vaidoso (quanta ingenuidade!) e liberal no sentido de ausência de preconceitos (bota mais ingenuidade nisso). Quanto mais minhas aulas na Sorbonne avançam, mais evidente fica a constatação do quão ingênuo eu fui acreditando na biografia desses autores. Lógico que alguns eram fiéis e coerentes politicamente, mas que bobagem acreditar que uma história bem escrita está intimamente ligada ao caráter do escritor.
O que escrevi acima serve também aos professores e intelectuais. Quanta vaidade! Ao assistir alguns deles dando aulas lembro-me constantemente do personagem Bruno do romance do Houellebecq no livro “Partículas Elementares” que é professor e não consegue controlar suas taras na frente das estudantes vestidas com suas mini saias provocantes. E elas são bonitinhas mesmo com seus cabelos selvagens e peles branquinhas. Prontas para sorrir ou se impressionar por qualquer graça ou demonstração de saber. Vaidade é mais ou menos como a inveja, todo mundo tem ou sente, mas não a enxerga nele próprio ou não gosta de admiti-la como parte do pacote que forma o perfil de sua personalidade. Não deve ter cura, mas dá para controlar se o sujeito conseguir ao menos admitir que ela existe e está entre seus sentimentos menos nobres.
A vantagem de envelhecer está aí. Na descoberta e na aceitação dessas constatações. A gente se impressiona menos com as pessoas, o que torna a vida mais besta e sem graça, menos apaixonante, mas também não sente a menor vontade de impressionar os outros. Para a maioria a gente pode passar uma imagem de alguém meio “blasé”, mas a verdade é que quando a gente entende a pequeneza contida nos atos e nas palavras de um ser humano vaidoso, o sentimento natural é o desprezo. O orgulho a gente deixa para uma outra ocasião.
17.10.10
SEM FILTRO
Domingo é um dia diferente. Desde há muito tempo eu sei disso. Por alguma razão quando ele está apenas começando tudo parece bom, mas as horas passam e a partir do meio dia vou escurecendo. E escureço sempre muito mais rápido que o próprio domingo, lá pelas cinco horas da tarde já me transformei num breu total. Normalmente para atrasar esse processo mergulho na literatura, ou entro numa sala de cinema, hoje para variar fui à biblioteca Richelieu. Lá sentei-me algumas horas, li, estudei, olhei para os meus iguais, saí para tomar um café e quando voltei me misturei clandestinamente a um grupo de franceses que fazia uma visita guiada pelas salas de exposições da biblioteca. Ouvi atentamente as explicações do guia sobre as peças expostas, mas depois de algum tempo o sotaque cheio de tiques do moço começou a me fazer prestar mais atenção no seu jeito de falar do que nos objetos. Se em Viena a voz nasalada é utilizada pelos vienenses que se pretendem chiques e falam o schönbrunner deutsch, aqui começo identificar alguns trejeitos e um rabicho que sobra ao final de cada palavra dita que acredito não deve ter nenhuma outra utilidade a não ser pretender-se erudito ou sei lá o que. Sei que aos domingos algumas horas antes e algumas depois das cinco vejo o mundo completamente sem filtro. Todo o entorno descolore e passa a ser visto em preto e branco. E quer saber? Não acho tão ruim esse estado de alma. Até tenho um certo prazer nisso. Masoquista? Não, longe disso, mas muito mais disposto a dialogar com uma outra realidade que normalmente é ofuscada pela intensidade das cores.
Numa entrevista no Le Monde o escritor Charles Dantzig que acaba de lançar o livro intitulado “Por que ler?” diz que entre outras razões a gente deve ler porque ler não serve para nada. Porque a literatura não deve ter uma função utilitária, quando lemos estamos sós com o livro e é nesse momento que as coisas do espírito, isto é, tudo que não tem uma função prática, se comunicam e adquirem força. A literatura, se a gente puder dizer que ela tem uma função, é a de nos manter vivos num mundo embrutecido. Quando leio um romance não leio porque acho que depois de terminá-lo serei um homem melhor, mas porque durante a leitura esqueço tudo o que me distrai do que supostamente é vida. E quando estou escrevendo, acontece a mesma coisa, mergulho numa outra realidade que me ajuda a me manter vivo. Enquanto escrevo quero apenas contar uma história, e isso é o bastante para mim enquanto homem, não quero ensinar, não quero dizer nada, apenas contar uma história. Não li o livro de Dantzig, mas li o de Ítalo Calvino chamado “Por que ler os clássicos”, e recomendo. Se você acha que o livro do Calvino é didático e chato, não sabe o que está perdendo.
Veja como a vida da gente pode ficar menos complicada quando dizemos o que pensamos. Ontem fui jantar num pequeno bistrozinho que costumo ir de vez em quando. Como de costume sentei-me numa mesa escondida no fundo do local. O bistrô rapidamente lotou e quatro sujeitos sentaram-se à mesa ao lado da minha. Um deles não parava de fazer piadas, tinha a voz forte, falava muito alto e era do tipo que olha para os lados porque precisa da aprovação enquanto canta trechos de músicas antigas e solta gargalhadas constrangedoras. O proprietário do local passou algumas vezes de um lado para outro e depois de um tempo postou-se ao meu lado e me perguntou se eu estava me sentindo incomodado. Eu disse que sim. Corri o risco de tomar algumas porradas dos sujeitos, mas para minha sorte eles se limitaram a me olhar como se eu fosse um ser repulsivo e eles os normais. Os quatro foram obrigados a se mudar para uma outra mesa próxima da entrada/saída do bistrô. Pude jantar sossegado e ainda fui presenteado com um conhaque no final, que eu acho que foi um prêmio por ter falado o que pensava. Das duas uma, ou estou me transformando num ser insuportavelmente chato, ou o maioria das pessoas não tem semancol. Lógico que as duas variáveis são verdadeiras. E não apenas verdadeiras mas também dependentes uma da outra. Mas é isso, vou continuar a dizer que eles me incomodam, ontem o proprietário do bistrô confirmou o que eu desconfiava há algum tempo: não estou sozinho no mundo, existem outros chatos ainda piores do que eu.
Numa entrevista no Le Monde o escritor Charles Dantzig que acaba de lançar o livro intitulado “Por que ler?” diz que entre outras razões a gente deve ler porque ler não serve para nada. Porque a literatura não deve ter uma função utilitária, quando lemos estamos sós com o livro e é nesse momento que as coisas do espírito, isto é, tudo que não tem uma função prática, se comunicam e adquirem força. A literatura, se a gente puder dizer que ela tem uma função, é a de nos manter vivos num mundo embrutecido. Quando leio um romance não leio porque acho que depois de terminá-lo serei um homem melhor, mas porque durante a leitura esqueço tudo o que me distrai do que supostamente é vida. E quando estou escrevendo, acontece a mesma coisa, mergulho numa outra realidade que me ajuda a me manter vivo. Enquanto escrevo quero apenas contar uma história, e isso é o bastante para mim enquanto homem, não quero ensinar, não quero dizer nada, apenas contar uma história. Não li o livro de Dantzig, mas li o de Ítalo Calvino chamado “Por que ler os clássicos”, e recomendo. Se você acha que o livro do Calvino é didático e chato, não sabe o que está perdendo.
Veja como a vida da gente pode ficar menos complicada quando dizemos o que pensamos. Ontem fui jantar num pequeno bistrozinho que costumo ir de vez em quando. Como de costume sentei-me numa mesa escondida no fundo do local. O bistrô rapidamente lotou e quatro sujeitos sentaram-se à mesa ao lado da minha. Um deles não parava de fazer piadas, tinha a voz forte, falava muito alto e era do tipo que olha para os lados porque precisa da aprovação enquanto canta trechos de músicas antigas e solta gargalhadas constrangedoras. O proprietário do local passou algumas vezes de um lado para outro e depois de um tempo postou-se ao meu lado e me perguntou se eu estava me sentindo incomodado. Eu disse que sim. Corri o risco de tomar algumas porradas dos sujeitos, mas para minha sorte eles se limitaram a me olhar como se eu fosse um ser repulsivo e eles os normais. Os quatro foram obrigados a se mudar para uma outra mesa próxima da entrada/saída do bistrô. Pude jantar sossegado e ainda fui presenteado com um conhaque no final, que eu acho que foi um prêmio por ter falado o que pensava. Das duas uma, ou estou me transformando num ser insuportavelmente chato, ou o maioria das pessoas não tem semancol. Lógico que as duas variáveis são verdadeiras. E não apenas verdadeiras mas também dependentes uma da outra. Mas é isso, vou continuar a dizer que eles me incomodam, ontem o proprietário do bistrô confirmou o que eu desconfiava há algum tempo: não estou sozinho no mundo, existem outros chatos ainda piores do que eu.
13.10.10
LUXO
Como toda metrópole, Paris é uma cidade extremamente barulhenta. Logo de manhã sou despertado pelas vozes dos garis que conversam uns com os outros gritando e, a não ser que você tenha janelas com vidros anti ruídos, impossível não ouvi-los. Outro barulho perturbador é o som das sirenes das ambulâncias que atravessam a cidade ligadas num volume absurdo e inutilmente alto. Não entendo porque precisam fazer o escândalo que fazem, na verdade você corre o risco de morrer de susto se estiver ao lado de uma delas no momento em que o motorista ligar a sirene. Desde que li o último livro do David Lodge (“la vie em surdine” que recebeu o absurdo título em português “Surdo Mundo”) passei a reparar no enorme número de pessoas que usam aparelhos de audição. E o que me chama atenção é o número de pessoas cada vez mais jovem que precisa usar esses pequenos pontos antes vistos apenas nos ouvidos das pessoas mais velhas. Na Sorbonne tenho um total de seis professores, dois deles usam, e são relativamente jovens. Dia desses um deles, M. Fraisse, foi obrigado a interromper a aula até que a ambulância se distanciasse suficientemente para que ele pudesse continuar. São barulhos desnecessários, que vão desde o tom alto da voz de alguém que fala muito alto ao seu lado, passando pelos sons das chamadas dos celulares, escapamentos das vespas/lambretas, enfim, um montão de sons que poderiam ser reduzidos se as pessoas tivessem um pouquinho só de bom senso.
Hoje passei o dia inteiro na biblioteca François Miterrand fazendo pesquisa. O silêncio dentro das salas era de outro mundo. Um prazer inenarrável. Aproveitei para ver uma pequena exposição do fotógrafo francês Raymond Depardon chamada La France numa das salas de exposição da biblioteca. Tecnicamente as fotografias são perfeitas, imagens de fachadas de estabelecimentos comerciais no interior da França, enfim tudo que não me provoca a menor emoção. Mas o prazer proporcionado pelo silêncio me chamou para dentro das salas de leitura e logo eu esqueci as fotografias esteticamente perfeitas.
Na verdade gosto cada vez menos de tudo que parece perfeito ou do que pretende ser perfeito. O erro, a falha, o desvio, o desarrumado, o estranho, o que me força a pensar e ter que olhar com mais atenção para encontrar o belo onde ele parece não ter lugar, tudo isso vem me interessando cada vez mais.
11.10.10
BALANÇA MAS NÃO CAI
Desconfie de tudo que considerar evidente, tudo que é evidente é ideológico. Foi assim que meu professor de Sociologia da Cultura com sua voz mansa, mas nem por isso menos assertiva, abriu sua aula logo cedo e ajudou a despertar as dezenas de cérebros que ainda estavam acordando. Sentado na carteira da terceira fileira, minha mente ficou dividida, uma parte ficou atenta ao que ele nos falava e outra parte começou a digerir a frase e a buscar ressonância no nível pessoal. Isso não acontece raramente comigo, a tendência é sempre aspirar o que vem de fora e ver se serve ou cabe na minha experiência individual. E quase sempre serve e cabe. Assim visitei outras áreas mentais e encontrei lá dentro outros aprendizados que casam harmoniosamente com ela. Meus últimos anos de vida foram praticamente preenchidos por exercícios cujas práticas consistem em aprender a ver o que está por trás de tudo que os olhos simplesmente vêem. Encontrar o oculto no aparente, e depois o aparente no oculto, e mais adiante o oculto no oculto, o aparente no aparente e assim por diante. Prática que terei que fazer o resto da minha vida, porque toda nova situação me obriga a fazer novas reflexões.
Novas reflexões. Para sair do discurso que é evidente e cheio de armadilhas. Desconfiar. Do evidente. Das próprias reflexões. Da ideologia que aparentemente não tem corpo e está por trás de quase tudo organizando e acomodando o modo de pensar.
Todas as segundas feiras logo cedo terei esse senhor despertando minha consciência, me convidando a refletir sobre a maneira pela qual o irracional se exprime. Que sorte!
7.10.10
ENTREATOS E SUPOSIÇÕES
Desde o começo das aulas meu tempo livre ficou bastante reduzido. Tenho que ler muito, a bibliografia indicada pelos professores é bastante extensa. Além disso, os horários das aulas não são regulares, há dias em que tenho aula na parte da manhã e outros à tarde, e dias que tenho aulas antes e depois do almoço. Os livros servirão de base não apenas do conhecimento geral, mas também para trabalhos individuais, enfim, bastante puxado. Mas encontrei um tempinho para ir a Ópera, porque ninguém é de ferro e se não tiver um pouquinho de divertimento e prazer, a cabeça não descansa e aí é que a coisa não vai para frente. Assisti “Eugene Onéguine” de Tchaikovski na Bastille que é do lado de casa. Quase todo o elenco era composto de cantores russos, o que de alguma maneira garantiu um bom espetáculo, já que ele foi apresentado na língua original. Não que isso seja um pressuposto para a credibilidade da ópera, mas nesse caso o triângulo língua/expressão/sentimentos harmoniza como samba nos pés de um brasileiro. Mas uma das coisas que mais gostei nessa apresentação foi a cenário e a iluminação. Um trio de alemães que conseguiram ajudar a contar a história do prepotente e infeliz Onéguine com simplicidade e acredito também com pouco investimento. São eles Willy Decker na direção, Wolfgang Gussmann no cenário, e Hans Toelstede na iluminação. Logo que a cortina subiu fiquei impressionado com a artimanha usada para dar perspectiva e profundidade a imagem campestre e rural que o livreto escrito também pelo próprio Tchaikovski pede. E mantendo a mesmo cenário, mudando apenas a iluminação, dia e noite, sol e neve, montanha e salão de dança se tornavam críveis diante dos nossos olhos. Lógico que embalado pela bela música e áreas da ópera mergulhe fundo na história. Mas não é sempre que isso acontece, se algo não dá liga, você pode se sentir “excluído” e o espetáculo fica prejudicado.
Tenho recebido e-mails que denunciam os dois candidatos, Serra e Dilma, de todo o tipo de envolvimento ilícito ou outras acusações. Envolvimento de Serra com TFP, e Dilma sendo acusada de guerrilheira assassina são apenas dois exemplos do conteúdo desses e-mails. O conteúdo desses e-mails e as acusações podem ser verdadeiros? Sim. E podem ser falsos? Sim. O que não consigo entender é como algumas pessoas se indignam e se deixam convencer tão facilmente, sem se perguntar pelo menos uma vez se o que estão lendo é verdadeiro ou não e de onde esses e-mails podem estar vindo. Duvidar da imprensa oficial é um dever, e do que circula na internet uma obrigação. Menos gente, menos. Nem um nem outro é santo e vai fazer milagre, os dois são de carne e osso e tem partidos milionários por trás e seus múltiplos interesses. Podem me acusar do que quiserem, eu não botaria a minha mão no fogo por nenhum político, e por esses dois candidatos nem a pontinha do meu dedo.
1.10.10
DOUTOR EU NÃO ME ENGANO...
O jornal “Liberation” distribui gratuitamente exemplares aos estudantes da Sorbonne. O diário considerado de esquerda, ou melhor, um pouco mais “de esquerda” do que o tradicional “Le Monde”, tem um formato menor e traz artigos interessantes escritos pelos próprios articulistas e também outros escritos em conjunto por especialistas e outros intelectuais. Um amigo septuagenário gosta de afirmar que o jornal é a último guardião dos ideais de esquerda e que se sente um adolescente ao folheá-lo. Quando ouço a palavra guardião já sinto vontade de sair correndo, e como sou de uma geração que viu homens que se diziam de esquerda dançarem de rosto coladinho com os que se diziam de direita, leio, vejo e escuto tudo sempre desconfiando muito do conteúdo e de quem os produziu. Na quarta feira o “Liberation” trouxe uma matéria de sete páginas sobre o Brasil e as eleições. Fez uma análise sobre o governo de oito anos de Lula, o que mudou e o que não foi feito no país e ainda o que os próprios brasileiros pensam sobre o governo Lula. Trouxe entrevistas com candidatos que eu mesmo não conhecia, como uma puta do Rio de Janeiro que abandonou “a vida” para se dedicar à vida pública e defender os direitos da classe que quer representar, meia página com Raí, jogador de futebol querido na França e ídolo no PSG (Paris Saint-Germain), que fez críticas claras e objetivas ao governo Lula expondo a sua frustração e decepção em relação a falta de uma política pública voltada para a educação. Lógico que os ingredientes folclóricos, e não por isso menos realistas, da visão dos jornalistas estrangeiros entrou nas matérias, as favelas no Rio, as bairros marginalizados e esquecidos pelos governos de São Paulo, os muitos ricos, os muitos pobres, a trajetória da própria vida de Lula, a idolatria por sua mãe e etc... A matéria de jornal é rica em informação, e passa a impressão ao leitor estrangeiro de que muita coisa mudou no Brasil desde o início do governo Lula. Infelizmente eu não consigo compartilhar da mesma opinião. A sensação que tenho é de que estruturalmente nada mudou no Brasil. O paternalismo foi intensificado, a miséria continua existindo, a crença de que o Estado deve dar de graça casa e comida foi amplamente aprofundada, no quesito educação pública nada foi feito, a segurança pública piorou, e exemplos de como prosperar utilizando-se da esperteza e da malandragem foram difundidos publicamente e justificados de acordo com a conveniência dos homens públicos que lucraram com o governo. Amigos lulistas me criticam, argumentam que não se pode fazer tudo em oito anos. Concordo. Mas vocês concordam que dá para começar a fazer alguma coisa nessa direção em oito anos? No artigo Serra foi qualificado como de direita. Eu sinceramente vejo Serra como um grande e enorme zero a esquerda. Seu governo em São Paulo foi um exemplo de “laissez faire”, não como símbolo do liberalismo econômico, mas literalmente porque ele não fez nada que eu consiga me lembrar de importante para o Estado, tudo funcionou sozinho, com ele governador ou não, as coisas se desenvolveram (ou não) sozinhas. Da mesma forma que não consigo acreditar que ele no governo federal modificaria alguma coisa, sorry, mas o PSDB escolheu um sujeito inexpressivo e vaidoso para disputar a presidência com a pupila de Lula. Para terminar quero dizer que acredito em mudanças sim, mas não nessas superficialmente construídas sobre o suporte econômico e da estética. Cortes de cabelo, plásticas e liftings ajudam a mudar a aparência, mas os sujeitos que se submetem a esses artifícios continuam os mesmos por dentro, a gente fala que eles estão belos e eles acreditam, é simples assim. Em relação a um país a coisa não funciona dessa maneira, você pode fazer uma plástica aqui ou ali, mas não consegue esconder por muito tempo as partes do todo que não foram bem tratadas. As reformas devem ser estruturais, seguir um plano que pode precisar de gerações para começar a dar resultados. Educação é um exemplo disso, sistema de previdência social e saúde é outro, reforma no judiciário, na segurança pública, nada disso melhora apenas com palavras, tem que reformar de verdade, ter coragem para aceitar que se não mudarmos o jeito de pensar, o agir estará sempre condicionado ao olhar folclórico que vem de fora. Aparentemente nenhuma dessas reformas garante voto e reeleição a quem se atrever a fazê-las. Pena, o tempo passou e aquele que poderia ter entrado na história como o presidente que realmente fez mudanças que teriam mudado estruturalmente o pais, não as fez, ficou na janela vendo o bonde passar, vaidoso de suas políticas econômicas e assistencialistas. O poder sempre corrompeu e não tenho dúvidas continuará botando na horizontal homens imbuídos de boas intenções, mas que chance perdemos com um homem que termina o seu mandato com a popularidade altíssima e que poderia ter se arriscado mais! Seja quem for o novo presidente do país, Dilma ou Serra, aposto minhas fichas que mais uma vez nada será feito nesse sentido. Porque a sociedade é quem deveria exigir, e então voltamos para o início da conversa, seria preciso saber exigir. Para mim o patrimônio de um país e de seu povo não deve ser medido apenas pelo acesso aos bens materiais, mas também e antes de tudo pelos imateriais, aqueles que nao podem ser comprados, como educação, cultura, saúde, e nesse sentido acho que Lula deixou a desejar. Ainda estamos correndo atrás do atraso, nos contentamos com muito pouco, ainda estamos no negativo.
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