3.1.05

SORRISO-TROCO.








O dia amanhecera exatamente como ela
havia desejado antes de dormir. Céu azul,
o sol brilhando como um ovo estalado sobre a terra
e o mar assustadoramente calmo.
Deus, enfim, havia ouvido suas preces.
Aquele seria um dia especial.
Pensou até em fazer um bolo, comprar flores, enfeitar
a casa, mas decidiu não ceder a tentação de usar qualquer
tipo de artimanha que pudesse contribuir com o ritmo
natural daquele dia.
Alguma coisa cochichava dentro de sua cabecinha:
aquele seria um dia especial de qualquer forma.
Independente de seus atos. Independente dos fatos.
Escovou os dentes, tomou um banho demorado,
maquiou-se, e vestiu-se com o rigor de alguém
que se prepara para ir a uma festa.
Ainda era cedo quando botou os pés na rua.
De alguma maneira até o ar lhe pareceu mais leve.
Respirou fundo, atravessou a rua, e sorriu para a primeira
pessoa que cruzou o seu caminho. Em seguida, sorriu
para a segunda, para a terceira, para a quarta e para
toda a gente que encontrou. Independente de cor, raça,
sexo, cabelo, perfume, jeito de falar. Ai meu Deus!
Fazia tanto tempo que ela não olhava para a cara das
pessoas, que até havia se esquecido de como elas eram
diferentes. No fim do dia voltou para casa.
Cansada, porém satisfeita.
Os músculos ao redor da boca doendo de tanto sorrir.
Não quis nem assistir a novela. Entrou na cama e
agradeceu a Deus por aquele dia especial.
E fez um pedido. Que todo os dias fossem especiais.
Para todas as pessoas desse mundo.
Especialmente para àquelas que haviam lhe
virado o rosto enquanto sorria.
E também para aqueles, que como os últimos,
certamente um sorriso-troco lhes negariam.


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