31.1.05

PARA M.M.M.O NÃO ESCRITOR. GRATIDÃO NÃO SERIA A PALAVRA MAIS INDICADA.










Nasci trazendo comigo toda a esperança do mundo.
Cresci ouvindo minha mãe contar histórias sobre meu pai.
Um grande homem. Lutou pela igualdade dos homens na terra.
Não o conheci. Morreu enquanto eu ainda era uma pequena
semente dentro da barriga dela. Dizem que antes de morrer
ele sussurrou meu nome muitas vezes. Olhava para o vazio
e falava baixinho “Asclépio, Asclépio”. O oficial que
cuidava dele na cela não entendia nada. Gritava pra ele
falar mais alto o nome do comparsa e ele
não alterava o tom de voz. Continuava sussurrando
bem baixinho “Asclépio, Asclépio”. Desceram o cassete nele.
Coitado. Homem bom. Lutou pela igualdade dos homens na terra.
Morreu sem me conhecer. Eu o Asclépio.
O camaradinha, como seus amigos ainda fazem
questão de me chamar. Camaradinha Asclépio.
Dizem que foi esse seu último desejo.
Um mundo melhor. Horas antes de trazerem ele de volta
para a cela alguns de seus camaradas ainda puderam
falar com ele. Dizem que ele não falava de outra coisa.
Quero um mundo melhor pro meu filho. Só isso. Veja só.
Um mundo melhor pro meu filho. Imagine quanta grandeza
existia dentro daquela alma. Eu nem havia nascido e ele
já idealizava um mundo melhor para mim.
Lutou pela igualdade dos homens na terra.
Morreu sem me conhecer. Ainda outro dia,
no ponto de ônibus encontrei um de seus camaradas.
Olhou pra mim e disse: "É camaradinha Asclépio,
seu pai foi um grande homem. Idealista. Justo.
Brigou até o último minuto de sua vida pela igualdade
dos homens na terra. Um Jesus Cristo dos trópicos!
Um Gandhi tupiniquim! Que homem! Não tinha ódio no coração.
Apesar de tudo. Apesar das surras constantes que levou
dos policiais. Ele dizia que era tudo culpa da imobilidade social
e política do país. Eles são inocentes ele dizia.
São vítimas assim como nós. Vítimas." E os olhos do camarada
amigo do meu pai se encheram de lágrimas. Eu acredito.
Só posso acreditar. Nem quero pensar em outra hipótese.
Quem sou eu pra duvidar? Antes de embarcar no ônibus ele
ainda apontou pra cara do cara de boina estampado na
camiseta que eu usava e falou: "é camaradinha, passou,
foi-se o tempo, os homens e suas ideologias, estão mortos.
Todos! Não nos resta mais nada. Nada!"
Eu heim! Que coisa! Que falta de esperança!
E pensar que esse camarada foi amigo do meu pai!
Um homem que lutou tanto pela igualdade dos homens na terra!

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