23.7.10

ACEITE A SUA


“Ninguém pode obrigar uma pessoa a aceitar sua sorte”. Voltei para Paris pensando nessa frase “spruch”, que um amigo austríaco costuma repetir sempre que faz algum comentário sobre pessoas que apesar de todos os indícios de que deveriam seguir um caminho, escolhem outros rumos. Conheço esse “spruch” há décadas, mas só agora a frase iluminou-se e ficou evidente. Preciso de tempo. Mesmo que aparentemente eu as compreenda, e as incorpore em meu cotidiano, preciso de muito tempo para entender seus desdobramentos e significados. Como saber que esse ou aquele é o caminho a seguir? Não sei. Não tenho respostas práticas como num manual universal de instruções. A vida de cada um de nós parece vir com uma receita que só funciona individualmente. O que é bom para mim pode não ser bom para o outro e assim por diante. Sei que esse post está com cara de trechos retirados de livros de auto ajuda, mas juro que não é essa a minha intenção. Não tenho essa pretensão, só vontade de escrever sobre o que venho pensando e observando nos últimos dias. A gente passa a vida tendo que fazer escolhas, mesmo que elas não se apresentem como tal, mas raramente tem certeza de qual escolha fazer. Particularmente tento ouvir uma voz que de uns tempos para cá passei a acreditar viver e existir dentro da minha cabeça. Dialogo com ela e tento ouvir o que ela me diz. No começo achava que era a minha própria voz dizendo apenas o que me era conveniente ouvir, mas com o tempo percebi que essa voz é meio geniosa, só me permite escutá-la quando realmente tem algo a me dizer. Então espero. Durmo. Dou mais tempo a ela, e depois volto a puxar conversa. Se o silêncio continua, desisto, não insisto, espero até que ela se manifeste.

Numa conversa descobri um autor austríaco, Walter Kappacher, que em 2009 ganhou o prêmio Georg Buchner de literatura, talvez o mais importante dos prêmios para os autores que escrevem na língua alemã. Saí da conversa com um pequeno livro de capa dura chamado “Cerreto”, que o autor lançou em 1989. Um tesouro, que contém registros de viagens na Toscana, mistura de ficção e diário, me lembrou Ítalo Calvino, pela delicadeza, escolha de imagens e por vezes a melancolia. Não sei se ele já foi traduzido para o português, se ainda não foi, estamos perdendo muito. Antes de viver da escrita, Kappacher hoje com 70 anos fez de tudo um pouco, foi mecânico de automóveis, agente de viagens, e apenas após fazer 40 anos pôde se dedicar integralmente a literatura e viver como escritor. Li algumas entrevistas dele, pois é, da tal da escolha ele também não conseguiu escapar, ou será que ele não tinha escolha?

Um comentário:

Lícia disse...

Oi K, adorei as reflexões, fazem pensar e reverberam. Ou será o contrário...
beijocas agradecidas.