12.8.10

TIPO EXPORTAÇÃO

Tenho ainda todos os dentes da boca. Alguns já bem remendados, mas todos estão ali lado a lado e abraçadinhos. Dias antes de sair do Brasil fui ao dentista para um check-up. Um dente precisava de reparo, os outros estavam em ordem, ainda fiz uma limpeza e sai o mais rápido possível do consultório. Não conheço outra pessoa que tenha tanto temor de ir ao dentista como eu. Sofro só de pensar em tratamento dentário e fujo de dentista como o diabo foge da cruz. Mas não poderia falar um ai do meu dentista que é um exemplo de paciência e delicadeza, sabe lidar com os meus medos e apesar de toda a minha chatice ainda me trata com todo cuidado possível. Pois ontem senti uma dor num dos meus dentes do siso, mexi um pouquinho nele e achei que estava meio bamba. A noite, provavelmente de tanto verificar se ele estava mesmo balançando ou era apenas impressão minha, ele começou a doer. O que fazer? Ir ao dentista de urgência na França nem amarrado! Comentei com um amigo e ele me disse que tinha um remédio que era milagroso contra todo tipo de dor. Tomei o tal do remédio e em alguns minutos cai num sono profundo, tive sonhos incríveis e prazerosos e outros ainda sem pé nem cabeça, no total dormi quase doze horas seguidas e acordei novinho em folha. De manhã a dor havia passado. Mexi no dente e tive a impressão de que ele ainda estava meio bambalelê, mas preferi não provocá-lo. Quando sai de casa, entrei na primeira farmácia que encontrei e pedi uma caixinha do remédio milagroso, queria me prevenir já que um homem prevenido vale por dois. A moça me olhou com uma cara meio esquisita e pediu para que eu repetisse o nome do remédio. Repeti e ela disse que não poderia vender o remédio porque ele só pode ser vendido com receita médica. Insisti. Ela continuou firme e me explicou que o tal do remédio milagroso é composto quase que na sua totalidade de morfina e que isso poderia causar danos a minha saúde e até dependência química. Compreendi rapidinho a razão de todos aqueles sonhos incrivelmente prazerosos e do meu sono profundo. Fazia tempo que não dormia tão bem. Mesmo assim, entrei em mais outras três farmácias a fim de ver se conseguiria comprar o medicamento e em nenhuma delas me venderam o remédio. Sai de uma delas com outro analgésico na mão, deve ser um tipo de aspirina que pode ser vendida sem prescrição médica. De qualquer forma acreditei que as farmácias daqui seguiam rigorosamente as recomendações dos médicos e cumpriam as leis, fiquei quase convencido da seriedade dos profissionais daqui. Mas foi por pouco tempo. Meu amigo me ligou mais tarde para saber como eu estava e eu contei a ele sobre as minhas tentativas frustradas de comprar o medicamento. Do outro lado da linha ele brincou e disse que a noite quando chegasse em casa ia me provar que a França em muitos aspectos é muito parecida com o Brasil. Fiquei na dúvida, ele brincava ou falava sério? Agora pouco ele chegou. Trouxe consigo duas caixas do tarja preta e as expôs sobre a mesa como se fossem dois troféus. Perguntei como ele havia conseguido e a resposta foi também muito parecida com as que eu teria recebido de qualquer um de nós brasileiros espertos: “basta ir as farmácias certas e falar com o farmacêutico certo”. Pelo visto, o jeitinho brasileiro se infiltrou por aqui sem passar pela alfândega.

Um comentário:

Lícia disse...

Santa indústria farmacêutica...males que vem para bem.